segunda-feira, 1 de maio de 2017

Eu (quase) te entendo, Belchior


Editado.

Belchior, um dos cantores e compositores mais queridos de sua geração, morreu ontem, dia 30 de abril de 2017. Uma pena e uma perda enorme, sem dúvida, um cara de tão bom caráter, que se importava com a dor alheia, que nunca temeu em expor seu coração selvagem, que nem falou numa de suas músicas. 

Além disso tudo, a criatura humana ainda foi responsável por um sair de cena único na história das artes brasileiras, porque ele simplesmente sumiu, largou tudo que todos podiam julgar importante, tipo família, amigos, conhecidos, pertences e, um monte de dívidas e se escafedeu, foi embora do país, encontrado dois anos depois no Uruguaia, por chatice da Rede Globo. Lembro que à época (e ainda hoje) achei genial ele ter fugido de tudo o que o afligia, as relações antigas, decepções, a força da grana que ergue e destrói coisas belas (essa é do Caetano). Ah, como eu invejei. até porque, esperto que só, Belchior foi logo pro Uruguai, esse paraíso idílico nos confins da América do Sul.

Mas não se engane meu povo, nunca fui muito fã do pessoal do Ceará, o trio Fagner, Ednardo e Belchior, e desse último, confesso que cultivei um certo abuso durante muito muito tempo. Abuso injustificado, mas nunca cheguei a querer bem e me identificar, como todos que choram por ele hoje. É uma especie de abuso por transferência. Conheci duas pessoinhas que simplesmente o amavam, as quais eu não amava. Uma amizade antiga, do tempo de escola, que passava tarde ouvindo vinis do Belchior e o comparando a Bob Dylan. Naquele tempo, eu que ouvia Smiths, achava um absurdo, um exagero, hoje acho os dois muito próximos, Dylan é uma óbvia influência de Belchior, até nos maneirismos, na poetice etc. A outra pessoa, coleguinha de grupo de pesquisa, que escreveu uma dissertação (ou tese, ou ambos) sobre Belchior, coisa de análise de discurso. E calhou da criatura ser um porre de vodka barata. Aí minha gente, eu liguei essa gente chata com o coitado do Belchior, que não tem culpa dos fãs escrotos que tem.

Fora tudo isso, uma das letras mais impactantes da música brasileira, uma das minhas músicas favoritas na voz da Elis é dele, Como nossos pais. Ou seja, não tem razão esse abuso e por isso mesmo, passou.

Nunca o amei, mas estimo, choro e sofro do mesmo coração selvagem e entendo a fuga. Agora, ele fugiu de vez.

Escrevi este texto antes de saber que o citado cantor era pai ausente, e que um dos motivos de sua fuga foi pra não pagar pensão alimentícia de quatro filhos. Realmente,ele era mais um rapaz latino americano, que foge de suas responsabilidades amparado por esse mundo machista. Pra entenderem leiam aqui e aqui.

Inté.

Um comentário :

  1. Também,quando penso em Belchior,me encontro numa série de controversas.Eu amo tudo que ele escreve,eu sinto incessantemente.Mas eu não posso desconsiderar que a liberdade que ele tanto vendia era também imprudência.

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Sejam educados, seus lindos!

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